Assunto: Trovadorismo. A lírica e a épica trovadoresca.
1. História: O Trovadorismo é o
período literário que vai de 1189 (ou 1198?) a 1418. Seus limites correspondem,
respectivamente, ao ano provável da primeira cantiga registrada, “A Ribeirinha”
ou “Cantiga de Garvaia” (1189 ou 1198), da autoria de Paio Soares de Taveirós e
a indicação de Fernão Lopes como guarda-mor da Torre do Tombo (1418).
Como a produção poética desse período era
destinada ao canto, acredita-se que muitas dessas composições se perderam. As
que chegaram aos nossos dias são aquelas registradas nos cancioneiros.
1.1 Principais cancioneiros:
·
Cancioneiro da Ajuda: Composto nos fins do século
XIII, durante o reinado de Afonso III.
Encontra-se na Biblioteca da Ajuda,
em Lisboa.
Das suas 310 cantigas, quase todas são de amor.
·
Cancioneiro da Vaticana: Foi copiado na Itália,
no final do século XV, ou, início do século XVI,
encontrando-se depositado na Biblioteca do Vaticano, donde deriva o
nome pelo qual é conhecido. Entre as suas 1205 cantigas, há composições de
todos os gêneros.
·
Cancioneiro da
Biblioteca Nacional de Lisboa: É um dos quatro
cancioneiros renascentistas de música
portuguesa. Este cancioneiro é uma compilação de músicas tanto seculares quanto sacras dos séculos XV e XVI. Nenhuma das
músicas faz referência ao nome do compositor, mas por comparação com outros
cancioneiros se sabe que algumas delas foram compostas por Francisco de Peñalosa, Juan de Anchieta, Pedro de
Escobar entre outros.
2.
As Cantigas
Criadas por trovadores, poetas das cortes feudais, retratavam sentimentos
amorosos entre cavalheiros e damas da nobreza (cantigas de amor), entre
uma jovem camponesa e seu amante distante (cantigas de amigo) e no
sentido de criticar ou ridicularizar situações do cotidiano (cantigas de
escárnio e maldizer).
2.1 Cantigas de amor:
Na cantiga de amor, o enunciador é um
homem que confessa seu sofrimento causado por um amor impossível a sua senhora (mia
senhor).. Dessa forma, a mulher é idealizada, inatingível e sempre colocada em
um plano elevado. Essa relação é conhecida por “coita d’amor” (amor-sofredor). O
amor se baseia na relação vassalo/senhor, refletindo o sistema feudal e a divisão
de classes sociais: clero, nobreza e povo.
Cantiga da Ribeirinha, de Paio Soares de Taveirós
No
mundo nom me sei parelha,
mentre me for' como me vai,
ca ja moiro por vos - e ai
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
mentre me for' como me vai,
ca ja moiro por vos - e ai
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
Mao
dia que me levantei, que vos enton nom vi fea!
E,
mia senhor, des aquel di', ai!
me foi a mim muin mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d'aver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vós ouve nem ei
valia d'ua correa.
me foi a mim muin mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d'aver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vós ouve nem ei
valia d'ua correa.
Paráfrase: “No mundo ninguém se
assemelha a mim / enquanto a minha vida continuar como vai / porque morro por
ti e ai / minha senhora de pele alva e faces rosadas, / quereis que eu vos
descreva / quanto eu vos vi sem manto (saia: roupa íntima) / Maldito dia em que
me levantei / que não vos vi feia! (nunca viu mais bela)
E, minha senhora, desde aquele dia, ai / tudo
me foi muito mal / e vós, filha de Don Pai / Moniz, e bem vos parece / de ter
eu por vós guarvaia (guarvaia: roupas luxuosas) / pois eu, minha senhora,
como mimo (ou prova de amor) de vós nunca recebi / algo, mesmo que sem valor.”
2.2 Cantigas
de amigo
Na cantiga
de amigo, o enunciador é feminino, mas o autor era o trovador. Organiza-se
em torno do seguinte núcleo narrativo: a mulher, em geral uma camponesa, canta
seus males a outra(s) mulher (es) ou até mesmo algum elemento da natureza. Dependendo
do ambiente em que se passa, a cantiga pode ser uma alba (ocorre na aurora),
uma bailia (num baile), uma barcarola (à beira-mar), uma pastorela (ambiente
pastoril) ou uma serranilha (ambiente serrano). Diferente do platonismo da cantiga
de amor, a cantiga de amigo apresenta realismo em toda sua extensão.
Cantiga de amigo de
Martim Codax
Paráfrase
Ondas
do mar de Vigo
Se vires meu namorado!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Se vires meu namorado!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Ondas
do mar revolto,
Se vires o meu namorado!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Se vires o meu namorado!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Se
vires meu namorado,
Aquele por quem eu suspiro!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Aquele por quem eu suspiro!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Se
vires meu namorado
Por quem tenho grande temor!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
Por quem tenho grande temor!
Por Deus, (digam) se virá cedo!
2.3
Cantigas de escárnio e maldizer
A cantiga de escárnio
apresenta uma crítica velada a alguém cujo nome normalmente não é revelado.
Trata-se, pois, de uma sátira indireta, feita com palavras de duplo sentido.
Pela distância do tempo e pela falta de acesso ao contexto em que foram
produzidas, a interpretação de muitas delas é hoje motivo de dúvida e de
especulações até para os maiores estudiosos do cancioneiro medieval.
A cantiga de maldizer é a
sátira direta, em que o trovador não poupa o nome da pessoa criticada pelos
seus versos. Sem preocupação com as convenções do mundo cortês, há lugar para
palavras de baixo calão e mesmo para a pornografia.
Ai, dona fea
Ai,
dona fea, fostes-vos queixar
que vos nunca louv’ en meu trobar,
mais ora quero fazer un cantar
en que vos loarei tôda via;
e vêdes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
Ai dona fea, se Deus me perdon!que vos nunca louv’ en meu trobar,
mais ora quero fazer un cantar
en que vos loarei tôda via;
e vêdes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
e pois havedes tan gran coraçon
que
vos eu loe en esta razon,
vos quero já loar tôda via;
e vêdes qual será a loaçon:
dona fea, velha e sandia!
vos quero já loar tôda via;
e vêdes qual será a loaçon:
dona fea, velha e sandia!
Dona
fea, nunca vos eu loei
en meu trobar; pero muito trobei;
mais ora já um bon cantar farei,
en que vos loarei tôda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!
(Joan Garcia de Guilhade)
en meu trobar; pero muito trobei;
mais ora já um bon cantar farei,
en que vos loarei tôda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!
(Joan Garcia de Guilhade)
Tradução: Ai, dona feia,
foste-vos queixar/que nunca vos louvo em meu cantar;/mas agora quero fazer um
cantar/em que vos louvares de qualquer modo;/e vede como quero vos louvar/dona
feia, velha e maluca!/Dona feia, que Deus me perdoe,/pois tendes tão grande
desejo/de que eu vos louve, por este motivo/quero vos louvar já de qualquer
modo;/e vede qual será a louvação:/dona feia, velha e maluca!/Dona feia, eu
nunca vos louvei/em meu trovar, embora tenha trovado muito;/mas agora já farei
um bom cantar;/em que vos louvarei de qualquer modo;/e vos direi como vos louvarei:/dona
feia, velha e maluca!
3.
As
Novelas de Cavalaria
As novelas de cavalaria têm como origem a poesia épica de gesta (um tipo
de poesia épica, narrativa anônima, de tradição oral, que expõe as cenas de
batalhas ocorridas nos séculos VIII e IX). Tais poemas, que tratavam de temas
heróicos, perderam com o tempo seu formato em versos.
No âmbito de Portugal, destaca-se a A Demanda do
Santo Graal. Nessa novela conta-se a aventura dos cavaleiros do Rei Artur,
soberano de Camaalot. Eles partem em busca do Graal (cálice sagrado com o qual
José de Arimatéia recolheu o sangue de Jesus quando ele ainda estava na cruz),
cuja aparição ocorrerá de forma surpreendente aos olhos desses heróis, quando
estavam reunidos em torno da famosa mesa redonda. Trata-se de aventuras em que
são testados os valores da honra e da fé, em meio a lances fantásticos, frutos
da imaginação mística da Idade Média.
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